Juristas, professores e analistas exploraram os desafios e as práticas internacionais relacionadas com os Joint Operating Agreements (JOA) do sector. Longe de serem homogéneas, cada um dos acordos tem prós e contras que importa analisar. Ficaram as pistas para futuros desenvolvimentos.
Os Joint Operating Agreements (JOA), os desafios e as boas práticas internacionais estiveram no centro do debate do primeiro evento sobre oil & gas, em Lisboa, organizado pelo Let’sTalkGroup e com a Nova School of Business & Economics como anfitriã, no passado mês de Outubro. O papel dos agentes nas parcerias e o equilíbrio entre os direitos e deveres das partes foram alguns dos temas em cima da mesa.
Os JOA são um dos mais importantes documentos para as transacções de oil & gas, uma vez que neles são regulados os direitos e os deveres das partes envolvidas nas joint-ventures, explica Ricardo Néry, da MC&A Sociedade de Advogados. A maioria dos deveres está atribuída ao operador, a parte responsável pela administração das actividades correntes da joint-venture. Deste modo, explica o jurista, os modelos JOA focam-se habitualmente na perspectiva do operador. No entanto, os não-operadores também têm um papel fundamental no sucesso da operação. Para o efeito é preciso caminhar para um entendimento em que se identifiquem as necessidades e perspectivas dos não-operadores com o objectivo de chegar a um acordo eficiente, razoável e justo para todas as partes. No entanto não existe ainda um “modelo que faça face às exigências de uma grande variedade de perspectivas legais”.
As operações de oil & gas envolvem habitualmente investimentos de elevados montantes, recursos humanos altamente experientes, infra-estruturas complexas e riscos variados incluindo naturais, políticos, ambientais ou financeiros, sintetiza Eduardo Pereira, da University of Eastern Finland. O professor explicou que habitualmente as National Oil Companies (NOC) integram as joint-ventures criadas em torno das explorações petrolíferas através de enquadramentos regulatórios ou de negociações voluntárias, os JOA.
O professor listou os principais standards de JOA da indústria (APPL, RMMLF, CAPL, AMPLA, AIPN) ou emanados pelo próprio país (NPD, BMP, ONYHM, INP). Eduardo Pereira assinalou que existe algum desequilíbrio na relação entre os operadores e os não-operadores e apontou alguns aspectos a melhorar nomeadamente ao nível da circulação de informação, dos processos de votação, do acompanhamento dos programas e dos orçamentos, da partilha de riscos. Eduardo Pereira sugere aos agentes não-operadores, quando aderem a uma joint-ventures deste tipo, a “implementação de facto de JOA ” ou que “assegurem a sua posição através de medidas adequadas”.
Peter Roberts, managing partner da Andrews Kurth, em Londres, tem acompanhado, ao longo do tempo, processos de fusão e aquisição de empresas do sector a nível global. Este consultor explicou as múltiplas formas que os JOA podem assumir consoante o enquadramento legal de cada região. O Estado concede uma concessão a um conjunto de agentes, que, entre si, têm de firmar um JOA, no qual estão envolvidos operadores e não-operadores que podem disponibilizar serviços partilhados numa base contratual.
Na opinião do especialista, deveria existir um modelo de JOA standard que servisse de base ao desenvolvimento de cada JOA específico. “Os custos de transacção baixam e a eficiência da transacção aumenta através da utilização de um formulário pré-definido”, assinala. No entanto, os JOA são muito variados e são provenientes quer de associações sectoriais, quer da própria orgânica dos países. Alguns JOA remontam à década de 50 do século passado, outros a 2014. Nos países ou regiões onde é mandatório utilizar os JOA locais (Dinamarca, Gronelândia, Noruega, Marrocos ou Senegal), a indústria não tem opção, mas nos restantes locais as hipóteses são variadas, talvez demais. Peter Roberts detalhou as diferenças entre as principais opções (APPL, AIPN, AMPLA, CAPL e OGUK), apresentou modelos híbridos e apontou os aspectos a ter em conta aquando da análise dos mesmos. Os operadores podem utilizar qualquer modelo ou qualquer parte dos modelos onde quer que operem, excepto onde as regras são mandatórias. No entanto, ressalva que “nenhum dos modelos está preparado para desenvolvimentos não convencionais”.
Peter Roberts recomenda a alteração de aspectos chave dos JOA tradicionais (offshore e convencional), um processo que tem vindo a ser trabalhado ao longo dos anos, mas que “ainda não se ajustou totalmente” à nova realidade na qual os intervenientes são cada vez mais variados, incluindo private equity houses, bancos, pequenas empresas e empreendedores, muitas vezes com outros interesses para além do petróleo.
Armando Marques Guedes, investigador, explorou os desafios que estão a surgir na região marítima do Atlântico sul, uma imensa área que banha a generalidade dos países da CPLP, observadores associados e países oficial e formalmente interessados em associar-se à CPLP. O investigador explicou a relação entre a lusofonia e a segurança do Atlântico Sul, região na qual Portugal teve uma enorme influência durante a época dos descobrimentos no século XVI. Apesar do ambiente de instabilidade política e social que tem caracterizado ambos os lados do Atlântico Sul, assiste-se actualmente a um renascer do potencial daquela área, com a construção de novos portos, de novas plataformas de exploração petrolífera, enquanto se debatem os limites das zonas económicas exclusivas de diferentes países.
Também Ricardo Alves Silva, da Miranda & Associados, necessitou voltar ao passado para enquadrar o que é e o que foi África. Longe de ser um continente homogéneo é antes uma manta de retalhos em constante evolução. É um desafio constante o desenvolvimento de documentos de trabalho naquele continente, que reúnam consenso entre as partes (consórcios, operadores e não operadores) e na relação destes com os governos locais. Existem interesses divergentes entre as culturas nacionais e corporativas e os blocos de exploração envolvem, normalmente inúmeros agentes (empresas e países) o que acaba por levar a desentendimentos, prejuízos, diferentes perspectivas sobre os custos de produção ou fornecedores, entre outros. O advogado aproveitou a ocasião para detalhadamente explicar alguns aspectos dos JOA que poderiam ser uniformizados e quais os principais desafios aplicáveis à cadeia de valor do gás, desde o transporte, à transformação à disponibilização do produto aos consumidores, ao financiamento ou a estruturação do projecto.
Aboubacar Fall, partner da Geni & Kebe Law Firm, destacou as “oportunidades de investimento em África”, onde se tem registado um crescimento assinalável da indústria, com o aparecimento de novos players como Moçambique, Tanzânia, Quénia e Uganda. No caso de Moçambique, foi recentemente descoberta a maior reserva de gás natural liquefeito, cujas exportações deverão começar em 2020. A oportunidade de investimento em África é destacada quer pela exploração de novos blocos, mas também devido ao desenvolvimento de novas infra-estruturas de extracção e transportes e ao forte investimento estrangeiro no continente. Para demonstrar a diversidade de enquadramentos legais, Aboubacar Fall defendeu a necessidade de “um enquadramento legal e contratual estável e previsível para desenvolver negócios na área do oil & gas, incluindo naturalmente os JOA”. A título de exemplo, detalhou alguns dos quadros legais, entre os quais os JOA, existentes em África: na Argélia, em Angola, no Chade, no Egipto, na Guiné Equatorial, na Etiópia, no Quénia ou na Nigéria.